quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

O problema do Snapchat

Caros colegas, neste post irei abordar um problema que tem vindo a aumentar e que tem evidenciado sérias consequências: o uso de certos filtros do Snapchat tem mudado a representação do nosso rosto e a nossa auto-perceção, tornando assim as pessoas mais inseguras. Este conceito do ideal de beleza consegue revelar-se tóxico e problemático e tem vindo a afetar, maioritariamente, as mulheres jovens.
Primeiro, todos nós sabemos que, nos dias de hoje, parte da nossa identidade se define nas redes sociais globais. Assim se criam vícios e dependências, que chegam até a afetar a maneira como nos vemos a nós próprios, aos outros e ao mundo, incluindo o modo como comunicamos pessoalmente com as pessoas.
Snapchat é uma das redes sociais mais conhecidas de hoje, uma aplicação de mensagens maioritariamente visuais, ou seja, tendo por base a produção e partilha de imagens. É usada para tirar fotos e fazer vídeos de nós próprios, do que fazemos, com quem estamos e partilharmos com, nem direi os nossos amigos pessoais, mas sim os nossos seguidores. Porém, antes de carregarmos no botão “publicar” ou “partilhar” passamos pelo processo de atingir a perfeição inexistente, a fim de sermos “aprovados” pelos outros nesta comunidade virtual.

Muitos dos ajustes que fazemos nesse processo de aperfeiçoamento consistem em editar, usando aplicações que nos ajudam a melhorar e/ou eliminar o que não nos agrada. A utilização de filtros cromáticos também é uma opção, para obtermos uma fotografia mais viva ou com um efeito que achemos mais adequado.
Falando em filtros, chegamos a um ponto importante: uma das particularidades que tornou esta rede social tão popular foram os seus filtros — conhecidos como Snapchat Lenses, estes adicionam efeitos especiais às fotografias e aos vídeos, podendo modificar completamente a aparência e até a voz de uma pessoa. O Snapchat tem uma variedade imensa, desde simples corações a sobrevoar a nossa cabeça, até orelhas de cão, bambis e gatos, ou aureolas de anjos e coroas de flores. A pessoa usa estes efeitos numa selfie e fica com um ar adorável e perfeito; é um truque inofensivo, divertido e engraçado até... certo? 
Então qual é o problema? É importante relembrar a manipulação digital de imagem criada pelo Photoshop, ou pelo Facetune, entre outros. Ao que parece, estes programas permitem às pessoas ficarem  perfeitas. Ora, ver pessoas que ficam dessa maneira sem qualquer esforço cria a impressão de que “todas as pessoas” são assim e que nós não fazemos parte desse grupo. Isto porque o nosso cérebro tem mais facilidade em aceitar e pensar desta maneira do que em reconhecer que a fotografia foi editada. O Snapchat faz o mesmo, fazendo a pessoa habituar-se à sua cara deformada, ou deverei dizer “aperfeiçoada”, pelo filtro. 
O que acontece efetivamente à nossa cara quando usamos estes filtros? É difícil de reconhecer a panóplia de efeitos combinados que nos estreitam o rosto, aclaram a pele torna-se mais clara, diminuem o nariz, aumentam os olhos tornando-os brilhantes; deixamos de ter quasiquer imperfeições como cicatrizes, borbulhas, poros abertos, olheiras, hiperpigmentação. Este exercício de aperfeiçoamento acaba por nos vender um standard de beleza homogéneo e irrealista.
Assim, a pessoa começa a preferir ver-se deste modo idealizado, perdendo a identidade. Porque abusamos do uso destes filtros, começamos a criar o hábito de nos vermos assim, perdendo a noção de que aquela imagem é só um efeito; porém, começamos a preferir esse retrato perfeito ao nosso rosto natural. Saber que gostamos preferencialmente de nos ver transformadas não parece ser algo muito positivo para a nossa autoestima, não é? É como que se o o Snapchat nos desse a oportunidade de viver de acordo com a nossa versão ideal, imagem após imagem.
Fig.1
Fig.2
Fig.3
Fig.4
O problema começa a ter peso neste momento, quando raparigas – alguns rapazes, apesar de serem minoria, também são vítimas – dizem que já não gostam do seu rosto, que se acham feias, que já não conseguem tirar uma fotografia de si mesmas sem filtros e que perdem a perceção de como são na realidade. Cirurgiões plásticos têm recebido cada vez mais pacientes com a intenção de ficarem iguais àquilo que aparentam ser quando usam os filtros, iguais a esse standard idealizado. Isto já gerou uma designação científica, “Snapchat Dysmorphia”. 

Nós vivemos num mundo onde a vasta maioria das pessoas se preocupa com a sua aparência, i.e., com o modo como são vistas pelos outros e como se vêem a si mesmas. Termos tanto acesso às diferentes possibilidades de editar e modificar a nossa aparência pode levar-nos a perder autoestima e a viver numa insatisfação constante, porque nunca conseguiremos atingir os padrões de beleza que nos são constantemente impostos. Bem sei que estes filtros se tornaram normalizados e é difícil ver toda a problemática por detrás de algo que parece somente ser uma ferramenta rápida e eficaz para nos “fazer sentir melhor connosco próprios”, mas a verdade é que acaba por fazer exatamente o contrário.
Obrigada pelo tempo que disponibilizaram a ler esta publicação.
Boa noite.
Mihaela Gradinaru nº153122

1 comentário:

  1. Muito interessante a sua reflexão sobre este novo 'trend'; se é um tópico que lhe interessa, recomendo a leitura do segundo capítulo do Mirzoeff, sobre 'selfies' (o livro está disponível na biblioteca da FLUL).

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