Análise do Excerto de John
Berger
Neste
excerto de Ways of Seeing, John
Berger começa por afirmar e exemplificar
que a visão surge anteriormente ao desenvolvimento da linguagem verbal, assim
como a criança é capaz de percepcionar o mundo que a rodeia e expressar-se em
relação a este antes de conseguir descrevê-lo. Será seguro entender que a visão
de que aqui se fala é a visão como sentido físico e também como percepção das
realidades do mundo.
Seguindo
o exemplo da criança, é possível afirmar que Berger sustenta a noção de que, por muito que
tentemos explicar e categorizar aquilo que nos rodeia, essa tentativa de
descrição fica aquém do alcance da visão. John Berger defende, assim, que, no
próprio momento em que escolhemos aquilo para que olhamos, condicionamos a pluralidade
de realidades que a nossa própria visão potencia. E a visão, distinguindo-se
dos outros sentidos, constrói uma relação física de longo alcance e periferia
com o objecto, o que por si só constitui um distanciamento que nos abstrai da
realidade do mesmo. Isto é, se um ser alienado e cego agarrasse numa pedra de
sal, por exemplo, ia senti-la, cheirá-la, saboreá-la, até ouvi-la tal como ela
é, sem nomes e sem significados artificiais. A forma como interpretamos o
objecto que observamos é por si só
condicionada pelos nossos preconceitos individuais e culturais.
Desta
forma, como James Elkins propõe em The
Object Stares Back, o objecto da nossa visão relaciona-se connosco na
medida em que o(s) significado(s) que lhe é/são por nós atribuído(s),
conscientemente ou não, é/são imediatamente reflectido(s) em si, projectando a
mensagem de volta para nós e agarrando-nos dessa forma monovalente que nos
atrai pela familiaridade do significado.
Esta
familiaridade é possivelmente explicada pela existência de uma gramática visual
empírica. David Machin, em Introduction
to Multimodal Analysis,
sistematiza e define traços que permitem
descodificar esta gramática. Trata-se de uma ferramenta urgente, no contexto contemporâneo
de hegemonia da imagem, face à quantidade sem precedentes de imagens na qual certos
códigos visuais são instrumentais para a manipulação ideológica. É talvez
importante não esquecer que esta gramática é uma construção artificial
intrínseca à nossa cultura e talvez num plano mais abrangente e relativo, à
nossa espécie. (Porém, o mundo visto pelos olhos de um cão não é menos
verdadeiro do que o mundo visto pelos nossos olhos).
Face
às noções apresentadas, é possível afirmar que a nossa percepção do objecto é
absolutamente condicionada pela relação do objecto consigo mesmo, com os
elementos que o compõem, pelos elementos que o rodeiam e com os elementos
alojados no nosso saber enciclopédico. Ou seja, o contexto e o co-texto são
determinantes na análise do texto/objecto desta gramática visual.
Bibliografia:
BERGER, John. Ways
of Seeing (2008). Londres: Penguin.
ELKINS, James. The
Object Stares Back (1997). San Diego, Nova Iorque, Londres: A Harvest Book
Harcourt, Inc.
MACHIN,
David. Introduction to Multimodal
Analysis (2010). Londres: Bloomsbury.
Análise do excerto de John Berger proposta pelo aluno André Pereira com correcções e ajustes da professora Diana V. Almeida.
Grata, André! Como disse, julgo ser importante partilhar modelos de resposta que exemplifiquem estratégias de análise de texto, pois o meu objetivo fundamental como professora é dar-vos instrumentos de leitura do mundo (e dos seus vários textos).
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