quinta-feira, 9 de maio de 2019

Simbologia das Riscas

Boa noite colegas!

Agora que chegámos ao final do semestre, todos temos uma maior compreensão sobre o que é a Cultura Visual. Desviando-me um pouco do contexto do discurso publicitário, que temos lido e analisado à luz desta disciplina, gostaria de aplicar noutras áreas as ferramentas ganhas pelo estudo de Cultura Visual.
Se há duas ideias que retirei do Ways of Seeing do John Berger, elas são: a influência do tempo e o papel da arte no modo como lemos o que nos rodeia. Digo leio, porque não se trata apenas de ver, mas de interpretar o que se dá ao nosso olhar. Assim, venho apresentar-vos um vídeo de análise fílmica chamado Now You See It, sobre o significado de um determinado padrão ao longo da história do cinema. Trata-se do padrão visual mais reconhecível e, possivelmente, o mais utilizado— riscas.

Ora, estamos habituados a ver este padrão em diversos sítios, nomeadamente para chamar a atenção do espetador. Com efeito, as riscas são o padrão que mais se destaca dado o contraste extremo entre os seus elementos. Mesmo quando as cores contrapostas são de tons muito semelhantes, este padrão chama de imediato a atenção do espetador. É por este motivo que este é um padrão tão frequente em bandeiras, faróis ou sinais que exigem a nossa atenção.

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As riscas são um padrão inspirado em elementos da Natureza, a saber nas zebras. O contraste agressivo das listas pretas e brancas das zebras provoca confusão ao olhar alheio, não sendo possível concluir de que cor é o "fundo" do seu padrão. Aliás, a questão "De que cor são as zebras? São pretas com riscas brancas ou brancas com riscas pretas?" é tão inconclusiva quanto o famoso dilema natural: "O que veio primeiro, o ovo ou a galinha?". E a espécie humana tem adotado, ao longo dos séculos, este padrão.

No séc. XII, um grupo de religiosos católicos vindo das cruzadas chegou à Europa vestido às riscas, sendo fortemente ridicularizado. Isto levou o Papa a banir este tipo de vestes, tornando-se o padrão riscado um símbolo para os marginais. De facto, se olharmos para a pintura da Idade Média e do Renascimento, as personagens representadas com trajes às riscas são bobos, prostitutas, traidores, vítimas da Peste Negra, etc. Isto, numa época em que o modo de vestir refletia em absoluto o estatuto social de cada um.

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Facilmente as riscas passaram a simbolizar o Mal, o Diabo e Monstros. No cinema, encontramos um exemplo desta simbologia nas meias riscadas da Bruxa Má do Feiticeiro de Oz. Este significado foi apropriado, do ponto de vista prático, para destacar os prisioneiros, vestindo-os de cima a baixo com este padrão. Prática que, até à Segunda Guerra Mundial, continuou a realizar-se, abandonando-se depois, para evitar a referência aos campos de concentração Nazi.

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No entanto, na época moderna, começaram a surgir novas interpretações para este padrão, das quais se destaca o contributo dado pela bandeira da revolução, e da nova nação que daí emerge — os Estados Unidos da América. As riscas ganharam, assim, uma simbologia de resistência. Quem usasse riscas continuaria a demarcar-se do resto da sociedade como marginal, mas não no sentido moral e religioso. Com a ideia de revolução, as riscas começaram a apontar para um indivíduo livre, único. Esta interpretação, oposta à proposta na Idade Média, apenas contribui, na verdade, para exaltar o carácter contraditório deste padrão, isto é, a sua natureza contrastante.

No cinema, a utilização das riscas tem em especial atenção a espessura das mesmas. Começando por utilizar este padrão no guarda-roupa de gangsters, exaltando a sua marginalidade, e depois em homens de negócios, os designers encarregues da caracterização optavam por riscas mais grossas para personagens extravagantes e obviamente "trapaceiras", relegando as riscas mais estreitas a figuras mais elegantes e contidas.

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Há, ainda, uma linha interpretativa a ser mencionada, que se prende a relação entre as crianças e a higiene. Mais uma vez, temos de nos remeter à Idade Média, em que as roupas interiores eram simplesmente brancas, por ser da opinião pública que as tintas utilizadas para tingir as vestes eram uma forma de contaminação, por oposição à pureza do branco. Contudo, no séc. XX, as riscas apareceram como uma forma fácil de estilizar pijamas, antes brancos, e outros tipos de roupa "não exterior". Assim, as riscas passaram a ser comuns no vestuário infantil, como significantes de higiene. Mas, se pensarmos na natureza das crianças - ingénua, imaginativa, brincalhona -, não se enquadrando por completo com o "socialmente aceitável", aludindo também aos bobos medievais, as riscas continuam a manter parte do seu significado original.

O vídeo que vos tenho vindo a apresentar realça um exemplo particular do uso complexo das riscas no cinema: o filme Juno. Além de ser o padrão mais utilizado no seu vestuário pela protagonista, a história do seu significado reflete na perfeição a personalidade de Juno. Uma adolescente infantil, rebelde e que se destaca dos jovens da sua idade, graças ao seu modo de falar assertivo e exuberante. Além do mais, enquadra-se no grupo de marginais da sociedade, ao tratar-se de uma jovem de 16 anos grávida, com gostos peculiares que, mais uma vez, a fazem destacar-se das outras pessoas.
Termino, por fim, a minha apresentação/exposição do vídeo, que elabora ainda mais sobre o uso de riscas no cinema.


Caso tenham gostado do vídeo, aconselho-vos fortemente a seguir este canal de Youtube.
Até à próxima!
Joana Silva, nº148250

2 comentários:

  1. Que interessante ver como padrões comunicam de um modo tão sistemático, Joana! É a gramática visual de que falava o David Machin. Só uma nota, na Idade Média não havia propriamente roupa interior, o conceito surgiu no século XIX.

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  2. Adorei esta pequena história das riscas! Muito fixe!

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